História do Palácio

"Uma vez desembarcado do comboio e vindo da estação dos caminhos-de-ferro (sul-sueste) a caminho da cidade, o escritor Fialho de Almeida (in Estâncias de Arte e de Saudade) não deixou de reparar na «construção do cenógrafo Cinatti», chamando-lhe, nos finais do século XIX, «a mais elegante casa moderna da cidade»".

Joaquim Palminha Silva in Brochura Tribunal da Relação de Évora, 2008

O Tribunal da Relação de Évora foi inicialmente instalado no Largo das Alterações (1/10/1973), em casa nobre sobranceira à torre dita de «homenagem» na muralha da Porta de Alconchel, edifício fidalgo já no século XVI e, depois, acentuadamente no século XVIII, com piso térreo e andar nobre, então típico da época joanina. Herdeiro da «Casa do Cível» (Ordenações Afonsinas), o actual Tribunal da Relação de Évora tornou a mudar de casa, como soe dizer-se, reinstalando-se no edifício que a cidade conhece há um século como «Palácio Barahona». Tem, pois, um institucional inquilino desde o dia 26 de Novembro de 2007, o edifício imaginado e projectado na segunda metade do século XIX pelo arquitecto-cenógrafo italiano Giuseppe Luigi Cinatti, para servir então de residência nobre e citadina ao abastado lavrador José Maria Ramalho Dinis Perdigão (1830-1884). O Tribunal da Relação de Évora ocupa, portanto, como inquilino, de legítimo entendimento cultural, histórico e institucional o «Palácio Barahona»!

Erguido à porta da cidade, no Rossio de S. Brás, tomando-se de imprevisto e ostensivo fôlego, o edifício arrebata-nos ainda hoje com sua singular implantação, na que foi a mais marcante entrada da cidade a partir da segunda metade do século XIX. Uma vez desembarcado do comboio e vindo da estação dos caminhos-de-ferro (sul-sueste) a caminho da cidade, o escritor Fialho de Almeida (in Estâncias de Arte e de Saudade) não deixou de reparar na «construção do cenógrafo Cinatti», chamando-lhe, nos finais do século XIX, «a mais elegante casa moderna da cidade». Não se conhecem documentos sobre a contratação de Giuseppe Luigi Cinatti pelo lavrador, nem tão pouco se encontrou até hoje qualquer esboço ou projecto do palácio. Sabemos que o seu proprietário, destacado representante dos grandes agrários de todo Alentejo, em plena e bem sucedida ascensão económico-social e afirmação cultural, era considerado pelos obituaristas no ano da sua morte e seguintes (jornal Sul, nº316, 1884; Commercio e Indústria, nº98, 1887), «simples lavrador», embora capaz de «arrojo» e «activa e inteligente direcção» na lavoura. Todavia, parece que todos concordavam que não possuía «uma vasta ilustração literária».

Na verdade, a carteira de empreendimentos de José Maria Ramalho Dinis Perdigão, colocava-o como principal promotor e accionista do Banco Eborense e da Companhia Fundadora do «Teatro Garcia de Resende». Com o tempo, outro sopro cultural deveria ter adquirido o lavrador que, para além de pretender luxuosa habitação em Évora, entendeu afirmar o seu valor em matéria de estilo extravagante, bem como de mentalidade a denunciar estendedoiros livrescos, contratando para a construção do palácio a Giuseppe Luigi Cinatti, cujo trabalho na época era bastante apreciado e disputado pela aristocracia e alta burguesia da capital.

Esta contratação de Cinatti deve ter acontecido provavelmente nos anos 50 do século XIX, fazendo fé no Livro nº 66 das Actas da C.M.E., 1854-1857. Mais exactamente, na acta da sessão da Câmara Municipal de 12 de Maio de 1856, onde se registou o deferimento de um requerimento para troca de terreno, numa propriedade denominada Quinchoso por outro terreno no Rossio, escrevendo-se no respectivo «Livro das Actas» que isso tinha por objectivo possibilitar ao lavrador a edificação de residência nesta área da cidade. Diga-se de passagem, que a constante troca de terrenos entre o lavrador e a Câmara Municipal de Évora, acabou por se concluir com PALÁCIO BARAHONA | 7 vantagem maior para o palácio, aumentando-lhe o espaço de ajardinamento… Em 1859, compulsando o citado «Livro das Actas» da CME, ficamos a saber que José Maria Ramalho Dinis Perdigão já tinha «empreendido a edificação duma casa nobre na rua do paço», que o redactor municipal definia como «obra dispendiosa». Debaixo da luz tradicionalista da urbe, a construção da casa parecia toucar-se dum halo de inédito, vaporoso, ultra-romântico, algo que, bem se via, sobrenadava acima da terra e do tempo...

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